23.9.06

NUMA DEMOCRACIA FALSA, TODO VOTO É NULO

A democracia Brasileira, com seu sistema representativo e partidário, já não cumpre com a tarefa de ser democracia. Os pré-requisitos democráticos enunciados por grandes defensores da democracia, como Platão, Aristóteles, Péricles, John Locke, Thomas Hobbes, Jean Jacques Rousseau, Thomas Jefferson, Abraham Lincoln, entre outros, já não são cumpridos, e o povo brasileiro está refém de um governo oligárquico, com a ilusão de poder construir o próprio destino através do voto. Porém, o que está começando a ficar claro para o povo, que recebe suas informações desta mesma oligarquia, é que os candidatos não representam alternativas a escolher, mas a mesma oligarquia que nos engana há anos.

O sistema democrático que prevalece no mundo de hoje é o representativo, pois o sistema de democracia participativa, onde o povo interfere diretamente nas leis e na justiça, nunca teve uma oportunidade de desenvolver-se. Em todos os momentos históricos contemporâneos onde se tentou a aplicação do verdadeiro poder popular e democrático, como as Revoluções Francesa, Russa e Espanhola, as organizações de base foram simplesmente esmagadas pelas forças organizadas dos poderes instituídos e centralizados, fossem eles de esquerda, centro ou direita. Em síntese, a conclusão é simples: o poder, quando concentrado e centralizado, inevitavelmente corrompe aqueles que o detêm. Historicamente, sempre há um enorme esforço na manutenção deste poder por parte dos seus portadores. Leiam o livro A Revolução dos Bichos, de George Orwell – ele trata exatamente sobre isso, e é leitura obrigatória para quem realmente deseja um mundo melhor para todos.

Para que uma democracia funcione há inúmeras sugestões por parte de grandes pensadores que se manifestaram ao longo da conturbada trajetória das civilizações humanas. Assim, é engraçado o fato de que pouco se discute qualquer alternativa ao sistema atual. Observe que a grande mídia evita debater qualquer assunto que venha a balançar os alicerces do sistema instituído. Aliás, como comentamos antes, a quem interessa mudar o sistema atual? Aos políticos e governantes? Às grandes redes de comunicação que controlam o quarto poder? Aos bem remunerados juízes encastelados em seus luxuosos tribunais? Aparentemente, para os donos dos quatro poderes, a situação está deveras confortável. Mas quem realmente escreve e decreta as normas e regras deste pacto injusto? Nós, os supostos patrões? Ou aqueles a quem interessa a manutenção desta fórmula viciada?

Aristóteles dizia que uma democracia estável requer uma grande classe média para minimizar os antagonismos entre ricos e pobres. A ausência de classe média favorece o oligarquismo, o poder nas mãos de uma minoria. Aristóteles também dizia que uma pessoa não deve poder ter dois mandatos, para que as estruturas de poder não se firmem, e o poder fique na sociedade como um todo. Aristóteles viveu entre os anos de 384 a.C. a 322 a.C., ou seja, somente 2300 anos atrás. Por que admiramos Aristóteles, mas não damos ouvidos ao que ele disse? Ou, quem sabe, ainda não tivemos tempo para entendê-lo, pois as sugestões dele são aparentemente ignoradas, principalmente aqui no Brasil.

Segundo o pensador John Locke, a democracia representativa nasce de um contrato social onde cada cidadão cede seus direitos de decisão a uma pessoa eleita pela maioria, que deve redistribuir os direitos e deveres, sustentando a estrutura do estado e a constituição que o funda. Observe que, no Brasil, milhões de brasileiros estão fora deste contrato, pois a redistribuição dos direitos e deveres não é igualitária, não existe igualdade de tratamento de ricos e pobres pela justiça ou pelo legislativo. Poderia se dizer, portanto, que o governo brasileiro rompeu o contrato: não proporciona a igualdade.

A democracia brasileira não existe mais, tornou-se oligarquia, governo de poucos empresários e controladores de mídias de massa. John Locke também diz que em algumas circunstâncias o povo tem o direito, até a obrigação moral, de depor um governo corrupto!

John Dewey colocou que uma democracia depende de uma imprensa livre, da livre circulação de informações. No Brasil a imprensa é propriedade privada, e jornalistas com pensamento independente são perseguidos. O próprio Estado persegue jornalistas que fazem uso da liberdade de expressão (vide a perseguição da justiça ao jornalista Lúcio Flávio Pinto, no Pará, por ter chamado o maio grileiro do Brasil de “pirata” – em agosto/setembro de 2006). Também se pode lembrar do jornalista Bóris Casoy que recentemente foi demitido da Record por criticar o governo atual.

Assim, se as informações e a imprensa são controladas por uma oligarquia, e os votos são dados de acordo com o teatro encenado na mídia, a decisão do voto não é real. A eleição perde o seu significado e passa a ser um ritual de perpetuação da desigualdade e da injustiça social. A percepção de estar escolhendo o próprio futuro através do voto nessas circunstâncias é uma ilusão. Nesse contexto, onde o voto não atende às condições de liberdade e democracia, qualquer voto é nulo.

Segundo Platão, um dos pais da democracia, a participação popular é a base de toda democracia. No nosso caso, o povo cede os seus direitos a um governo eleito a cada quatro anos e se desliga da política. O povo precisa reassumir um papel ativo na política participando do processo democrático, das instituições, das decisões, precisa fiscalizar as ações dos seus representantes, precisa cobrar o direito de informações isentas de partidarismos que já não interessam mais aos necessitados. Precisa mostrar seu descontentamento e a prontidão para reagir, tomar o poder que é seu, e, com um novo pacto social, buscar a justiça social que a democracia deveria proporcionar.

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